1960/1975 – Stories for Boys

Páginas 11 a 13 - ADAM CLAYTON

Eu nasci em uma casa cheia de mulheres e repleta de música: duas forças que praticamente ditaram a forma subseqüente da minha vida. Foi na casa dos meus avós, em uma vila de Oxfordshire chamada Chinnor em 13 de março de 1960.

Meu pai trabalhava com aviação e sempre parecia que ele não estava muito presente. Até mesmo agora que ele se aposentou ele passa muito tempo pescando, o que é uma atividade muito solitária, longe da família.

Meu avô era um instrutor de educação física na Força Aérea Real Britânica, então ele não estava muito por perto também. Mas minha avó, a mãe dela, minha mãe e suas duas irmãs moravam todas nessa casa. Eu fui a primeira criança, um menino super mimado por esse grupo de mulheres.

Minha avó tocava piano em uma banda. Ela estava sempre fazendo shows nos fins de semana então sobrava eu com minha mãe e as duas irmãs. Eu me lembro de escutar o radio da Força Aérea e também saber que minhas tias tinham música que elas ouviam em tocadores de fita. Mais tarde apareceu uma vitrola e um monte de singles.

Minha tia mais nova gostava de Elvis e depois dos Beatles, quando todo aquele movimento começou. Eu me lembro de assistir Top of the pops em preto e branco e ficar muito intrigado pelas roupas e pelos instrumentos. Eu acho que até naquela época eu sabia dos tipos diferentes de guitarras, apesar de estranhamente o Ringo ser meu Beatle preferido.

Meu pai era piloto da Força Aérea Real Britânica e quando ele foi liberado começou a trabalhar como instrutor de vôo em Biggin Hill, e depois gradualmente ele passou para aviação civil. Minha mãe fazia um bico trabalhando de comissária de bordo e meu pai pilotava pequenos aviões do que eventualmente se tornaria a British Airways.

Quando eu tinha 4 anos de idade, meu pai encontrou um emprego no Quênia para pilotar para a East African Airways. Nós morávamos em Nairobi: esse definitivamente foi o período mais feliz que eu consigo me lembrar da minha infância; o calor e a liberdade.

Meus pais estavam vivendo relativamente com mais conforto comparando-se com antes, com um trabalho regular, uma casa de tamanho decente, alguém para limpar e ajudar, esse tipo de coisa. Eu me lembro principalmente do brilho do Sol e dos cheiros. Eu mantive muitas coisas africanas comigo e, quando eu vou para lá sempre me parece muito familiar.

O Quênia se tornou um país independente em 1963, expulsando o domínio Inglês, e a situação era inconstante. Em 1965 estava ficando bem perigoso ser uma pessoa branca por lá. Meu pai teve propostas de emprego na Irlanda e em Hong Kong, mas a Irlanda parecia mais próxima a família então fomos para lá e ficamos em Malahide, uma cidade do subúrbio na costa, umas 8 milhas (aproximadamente 12 Km) de Dublin. Eu fui para a escola nacional local e foi basicamente quando tudo parou de fazer sentido para mim. Eu cheguei em uma Irlanda que era sutilmente repressiva. O céu era cinzento e triste e na escola tinha muita coisa ensinada em irlandês, uma língua que eu não entendia. Eu achei difícil me encaixar naquele sistema.

Foi lá que eu conheci o David Evans, The Edge, pela primeira vez, apesar de eu não ter nenhuma lembrança disso. Os pais dele eram da mesma comunidade que, extraordinariamente para a Irlanda tinha muitos protestantes e ex-colegas Britânicos. Os Evanses estavam entre um grupo de pais que ocasionalmente ia a nossa casa, ou nós íamos visitar a casa deles, e foi assim que eu conheci o David, seu irmão e sua irmã. Nós não mantivemos contato até voltarmos a nos encontrar na banda.

Eu tenho uma irmã, Sindy, que é 4 anos mais nova que eu, e um irmão Sebastian, que é 10 anos mais novo. Mas é difícil para eu me lembrar, na maior parte do tempo, de nós como uma família. Nosso pai parecia estar sempre trabalhando. Como ele fazia muitas viagens cruzando o Atlântico pela Air Lingus, invariavelmente ele ficava fora de casa por 3 ou 4 dias.

Quando eu fiz 8 anos me colocaram num internato, o que só atrapalhou tudo ainda mais. A Sindy tinha 4 anos nessa época e então eu só a via nos fins de semana e feriados e por isso nunca desenvolvemos uma relação intensa ate estarmos mais velhos, simplesmente não tínhamos idades semelhantes para dividir experiências em comum. É até engraçado, mas apesar de haver uma diferença de idade maior entre eu e meu irmão, por alguma razão nos entendíamos, talvez porque quando eu sai do internato ele tinha 6 ou 7 anos então eu tive a oportunidade de conhecê-lo melhor.

O nome do internato era Castle Park, em Dalkey, ficava do outro lado da baía de Dublin. Pensando bem, eu posso entender que meus pais estavam num país estrangeiro –acho que é assim que eles deveriam ver- e eles não tinham idéia de qual seria a maneira apropriada de educar uma criança. Castle Park era uma escola preparatória na mesma linha do sistema britânico e alguns dos filhos de amigos dos meus pais estudavam lá e provavelmente eles viram que isso me levaria depois para uma boa escola pública Inglesa, como Eton ou Harrow, e depois um diploma de Oxford ou Cambridge. Esse era o plano, mas de qualquer forma não deu certo.

Eu não reagia ao internato de uma forma muito positiva. Eu não tinha vocação para esportes, não era uma pessoa muito sociável. Eu mantinha minha cabeça baixa. Até naquela época eu tinha inclinação pra música, mas não tínhamos permissão para ouvir música pop ou assistir televisão. Era só sobre esportes! Mas tinha um garoto que tocava violão clássico e ele tinha permissão para levar o violão para o quarto. Sempre que ele tocava, eu tinha uma conexão emocional. De alguma forma me levava em pensamento para fora dos confinamentos do internato. Conseqüentemente eu entrei para a Gramophone Society, que costumava se reunir umas 2 tardes por semana e ouvir música clássica. Novamente isso me levava para um mundo completamente diferente. Eu tentei aulas de piano, mas eu não conseguia juntar a aspiração com a coordenação.

Eu pensei que talvez por causa da minha avó seria fácil, mas eu presumo que eu nunca me empenhei o suficiente. Eu nunca tive o pensamento de que se eu praticasse talvez eu conseguisse os resultados que eu desejava!

Quando eu tinha 10 ou 11 anos eu comecei a me enturmar com pessoas que gravavam o Top Twenty (top 20) na rádio Caroline no domingo à noite e depois ouviam de novo, tudo escondido é claro. Não era permitido ouvir rádio no internato, mas alguns tipos de música eram permitidos. Podíamos ouvir ópera rock como Jesus Christ Superstar e Hair e coisas que estavam no meio entre música clássica e popular. Então isso foi o que me despertou naquela época e eu até pensava, ‘eu vou tocar violão’ mas eu tinha uma noção tão básica. Eu nunca sabia como eu ia chegar num nível mais avançado.

Eu mudei de escola quando tinha 13 anos, novamente para um internato irlandês, St Columbia em Rathfarnham. Os prédios eram velhos, não tinham cortinas e lá era muito frio, o tipo de frio que você nunca esquece. Não posso dizer que eu fiquei muito entusiasmado com essa mudança de colégio. Mas para ser justo, logo no inicio eu conheci um garoto chamado John Leslie, que tocava violão. John tinha fitas cassete e nós escutávamos The Who, The Grateful Dad, Kris Kristofferson, Caroline King, Neil Young, pessoas que eram famosas naquela época e coisas incomuns como Hawkwind, The Edgar Winter Group, Edgar Broughton. E os monitores (estudantes de séries superiores que tomavam conta dos alunos mais novos) escutavam Rory Gallagher, Beatles, Rolling Stones, Eric Clapton, então nós ouvíamos um pouco disso também, e alguns cantores americanos como Doobie Brothers. Então eu estava ficando bem ligado a música e parecia que sempre mudava meu humor; de alguma forma fez o internato se tornar suportável.

Eu me lembro de ler que Eric Clapton não começou a tocar violão até os 15 anos e então eu pensei ‘bom, eu ainda tenho tempo!’ Então eu comprei um violão que custou 5 libras em um brechó no cáis de Dublin e eu comecei a aprender algumas notas e tocar algumas músicas. Tinha um garoto na escola que tinha tipo uma banda começando. Ele tinha uma guitarra e a escola deu uma sala para ele praticar; tinha um baixista e um baterista e o som era simplesmente fantástico para mim, eu amava. Eu não sei como soava, provavelmente eram 4 adolescentes sofrendo para conseguir tocar uma música, mas o som do baixo, da bateria e da guitarra eram tão primitivos para mim. Eu comecei a perceber que não só a música me fazia sentir bem, como eu consegui um pouco de atenção por estar tocando também. Você conseguia se aproximar de garotas e pessoas que tocavam eram consideradas descoladas. Eu acho que foi ai que eu tomei a decisão de que era isso que eu queria fazer. Eu não tinha o menor interesse por esportes. Eu não queria ter uma carreira acadêmica e também não tinha a menor aptidão para isso. Eu gostava de coisas criativas como pintura e música; eu achava essas comunidades mais interessantes.

Então o John me convenceu que podíamos começar a nossa própria banda. Ele queria tocar guitarra então ele disse que eu devia tocar baixo. Não lembro de ter me convencido disso logo de primeira. Eu sabia que eram necessários uma bateria e um baixo para fazer aquele som vibrante, mas eu não sabia nada sobre música que me qualificaria como um baixista. Mas o John disse que me ensinaria o que eu precisava aprender. Eu estava tendo aulas de violão clássico e tinha um professor de violão popular que aparecia por lá também, então eu aprendi algumas coisas rudimentares e decidi tocar baixo. Eu falei com meus pais e pedi para que eles me comprassem um baixo. Eu tive que fazer aquela promessa solene de que eu não ia desistir disso e esse tipo e coisa.

Agora, olhando para trás foi uma coisa fantástica para os meus pais fazerem, não era do tipo deles. Era um pouco mais o tipo da minha mãe, eu acho. Ela tinha um lado romântico e provavelmente pensou que comprar um baixo não iria causar nenhum dano. Eu acho que por ter música na família ela conseguia se identificar com isso.

Então lá estava eu, com 15 anos, com um baixo marrom escuro e sem amplificador. Eu não tinha idéia do que fazer com ele. Absolutamente nenhuma idéia. Só parecia legal para mim. Profundo e satisfatório. Olhando bem, era esperado que alguém como eu tivesse alguns anos de experiência de rock amador e depois passar para algo como baixo. Mas o baixo era tudo que eu tinha, eu não tinha nada além disso.

Minhas notas foram tão ruins no ano seguinte que meus pais disseram que não estavam preparados para me manter numa escola tão cara. Foram noticias muito ruins para mim na época porque eu e John Leslie estávamos começando uma banda, estávamos escrevendo uma opera rock irlandesa baseada num mito céltico em que crianças são transformadas em cisnes pela madrasta bruxa. Mas eu tive que sair antes de ter a chance de me estabelecer como o Andrew Lloyd Webber da Irlanda.

Eu achei que era isso, a carreira musical tinha acabado. E lá fui eu despachado para Mount Temple, uma escola mais compreensiva no norte de Dublin, mas que não era um lugar que eu me sentia nem um pouco confortável, para contemplar um futuro não muito promissor em termos de esperanças de carreira.

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