1976/1978 – Another TIME, another PLACE

Páginas 43 a 48

Bono: Tinha a cabeça cheia dessas histórias. Às vezes era mesmo muito divertido ter o Dick na banda, porque uma pessoa escolhia uma música e cada um dos irmãos Evans tocava outra diferente. E lembro que o Larry, muito do seu jeito, estava sempre fazendo a mesma pergunta: “O Dick faz mesmo parte da banda?” E perguntou ao Edge: “tem certeza que o Dick quer mesmo estar na banda?” Até que acabamos percebendo que o que o Larry queria dizer era: “Ele tem mesmo que fazer parte da banda?” Porque não há nada mais assustador para um baterista do que o som das pessoas afinando os instrumentos, e bem alto. Continuo achando extraordinário que o Edge não olhe para baixo quando esta afinando. Felizmente, agora tem alguém que faça a afinação por ele. Nesta fase, os nossos ensaios eram apenas pessoas gritando umas com as outras do começo ao fim. A nossa primeira apresentação na televisão surgiu após uma discussão sobre como terminar alguma coisa.

Adam: Como de costume isso foi comandado pelo Bono. Ele tinha ouvido dizer que um produtor da RTE (televisão publica irlandesa) ia se encontrar com o Albert Bradshaw, o professor de música, para arrumar um coro para seu programa juvenil chamado: Youngline.

Edge: Fizemos constar que gostaríamos de participar do programa.

Adam: O Bono conseguiu que o Albert Bradshaw se comprometesse a trazer o cara para nossos ensaios. A idéia era dizer que éramos uma banda juvenil que escrevia e tocava as suas próprias músicas. Mas, aquele em particular, como acontecia em todos os ensaios, passamos a maior parte do tempo discutindo e não tínhamos ensaiado nada e não tocamos nada, pois estávamos muito ocupados discutindo.

Bono: Nós pensávamos: “Uma pessoa do mundo dos espetáculos e da televisão vem nos ver!” Por isso, estávamos ainda mais agitados e difíceis do que de costume e quando ele bateu na porta estávamos em plena gritaria. Paramos e ficamos sem saber o que fazer, pois não conseguimos tocar as músicas que queríamos, as nossas próprias músicas. E ele disse: “Ouvi dizer que compõem as próprias músicas.” E eu disse: “Sim, é verdade!” E ele disse: “Posso ouvir alguma?”

Adam: O Bono disse para tocarmos Ramones, porque eram melódicas e conseguíamos nos desenrolar bem.

Bono: Tocamos ‘Glad to See You Go’ dos Ramones e ele disse: “É fantástica!” Foram vocês que compuseram?” E eu disse: “Fomos.” E eles ficaram todos olhando para mim, tipo “Fomos nós?” “Sim, fomos nós!” Depois tocamos outra música dos Ramones, ele perguntou: “Essa também?”E eu disse “Sim.”

Adam: O produtor disse: “São músicas fantásticas. Nem parecem criadas por gente tão jovem.” E nós: “Foi fácil!”

Bono: Ele convidou para o espetáculo e quando chegamos ao estúdio de televisão tocamos as nossas próprias músicas. Ele nem reparou.

Larry: Tocamos ‘Street Mission’ e ‘Life On a Distant Planet’. Foi como sermos levados para a cabine de um avião, nunca tínhamos estado em um estúdio de televisão. Era bem menor do que eu imaginava. Era um espaço branco, com luzes penduradas no teto. Não havia público. Foi uma experiência incrível, e bastante estranha ao mesmo tempo, passar da minha cozinha para um estúdio de televisão. Foi outro acontecimento marcante. Nem estávamos acreditando que íamos mesmo aparecer na televisão. Nos dias de hoje, já não é nada especial, todo mundo aparece na televisão. Para uma banda punk irlandesa, nos anos 70, era algo de outro mundo. E, num momento muito pouco punk, resolvi polir o kit de bateria e os címbalos (pratos), porque achei que ia dar um ar profissional.

Edge: Fizemos a audição para a RTE como The Hype, mas na época em que participamos já éramos U2.

Bono: Eu gostava do nome Hype. Mas, para nós, era o nome de um grupo de punk rock e era evidente que esse não era o caminho que estávamos trilhando. O nosso caminho era outro. Não sei quem é que deixou de gostar do nome nem quem pensou em mudar, mas fomos conversar com o Steve Averill, ou melhor, o Adam foi e ele sugeriu alguns nomes.

Adam: Eu andava sempre agarrado na saia de alguém que nos pudesse ajudar de alguma maneira. O Steve Averill era filho de um amigo dos meus pais. Tinha feito parte do Radiators From Space, uma banda do início do punk, que editou um álbum e ele acabou desistindo. Duraram apenas seis meses e depois ele voltou ao seu emprego habitual como designer gráfico. Mas ele conhecia o meio. Devia ser uns dez anos mais velho que nós. Eu costuma ir na casa dele em Portmarnock. A mulher dele oferecia café ou alguma coisa para comer e ficávamos ouvindo música e conversando. Agora, recordando isso, fico espantado por alguém daquela idade ficar horas conversando com um adolescente, depois de um dia inteiro de trabalho. Foi muito generoso da parte dele. Naquela época ele estava numa de sintetizadores, como Devo, Kraftwerk e outros. Eu não percebia nada daquilo, porque preferia a energia do punk. Somos amigos já faz muitos anos. O Steve achava que Hype não era um nome sério. Começou por sugerir que pensássemos na roupa que vestíamos e disse que precisávamos tirar umas fotografias. Mais tarde, desenhou nosso primeiro cartaz e criou alguns pins.

Edge: Nós admirávamos o Steve Averill, porque fazia parte do Radiators From Space, e depois descobrimos que também era um fantástico artista comercial. Nos deu uma lista de seis nomes possíveis, para ser franco, não gostamos de nenhum.

Bono: Alguns dos nomes eram muito arrojados para mim naquele tempo e continuaram sendo. ‘Flying Tigers’ era um deles. ‘The Blazers’. Oh dear, oh dear...O que seria do rock n roll sem trocadilhos? Só a bem pouco tempo é que percebo que The Beatles era um trocadilho. Nunca tinha reparado. Os considerava tão fabulosos, que nunca tinha me ocorrido que fossem alegres apreciadores de jogos de palavras.

Adam: U2 surgiu naturalmente, do nome do avião espião, do qual eu tinha ouvido falar, pois a minha família esteve ligada a aviação. Não sei se os outros fizeram a mesma associação de idéia. Não era um nome obvio, não enchia os olhos. Era o que gerava menos desentendimentos.

Bono: O atrativo no nome U2 era a sua ambigüidade. Podia ter inúmeras interpretações. Para mim, fazia lembrar mais U-boat (submarino alemão usado na segunda guerra mundial), do que o Gary Powers e o seu avião espião, e isso me agradava. Estranhamente, a linha de trem que vem de Berlim e nos leva até a estação do jardim zoológico chama linha U2. Podemos vê-lo por todo lado em Berlim.

Edge: Era o melhor entre os piores. Pensamos naquele nome durante alguns dias e dissemos: “Bem, sempre é melhor que Hype. Por que não experimentamos durante algum tempo?” E escolhemos o nome U2. Á medida que o tempo ia passando, fomos gostando cada vez mais do nome. Tinha um impacto gráfico muito intenso. Não significava nada em particular, por isso, começamos a gostar do fato de não ter grandes conotações. E também nos diferenciava do The Whatevers, do The Jam, do The Clash, de todas as bandas que naquele tempo tinham nomes começados por “The.” O nosso nome era um pouco diferente, mas não foi de forma alguma um momento “Eureca”, tipo: “É o melhor nome do mundo.” Foi mais do tipo: “Serve”.

Adam: Acho que as pessoas reconheceram que tinha várias conotações. Era um nome moderado. Além disso, era só uma letra e um número, por isso, podia ficar em tamanho grande em um cartaz. E podia fazer parte de uma conversa banal, por isso, podia ser incluído em slogans publicitários e coisas do gênero. Todos concordamos que podia funcionar bem.

Bono: Eu detesto o nome, por acaso. Depois de pegar percebi que também era um trocadilho horrível. Ainda não tinha dado conta. Vocês também (you too= U2). Oh, não!

Edge: Havia muitos trocadilhos, bons e ruins, que o nome sugeria, mas nós estávamos interessados apenas na sua abrangência. Tínhamos uma série de pins dizendo: “U2 could happen to anyone”, que tínhamos feito na época. Cada pin tinha uma palavra com o nome U2 em cada uma delas: U2 COULD; HAPPEN; TO; ANYONE. Um conjunto de quatro pins que só faziam sentido se ficassem alinhados na ordem certa. Era bom para esse tipo de coisa, permitindo brincar com idéias diferentes.

Larry: Da primeira vez que nosso nome apareceu no jornal, nos chamaram de “U2 Malahide”. O que eles queriam dizer era ‘U2 de Malahide’, que, como é obvio, também não estava certo.

Edge: Nesta altura, o Adam tinha digamos que “optado” por sair da escola.

Adam: Ocorreram alguns incidentes na Mount Temple. Não havia uniforme escolar e acho que houve algum falatório sobre se um rapaz podia usar saia. Quando comecei a fumar, o dinheiro se tornou cada vez mais importante, pois precisava dele para poder comprar cigarros. Por isso, convenci várias pessoas a apostarem 50 pennies cada uma (cerca de 0,75 euros) em como eu não ia usar saia na escola. Esse foi o primeiro incidente.

Larry: Creio que um rapaz se despiu e andou correndo nu pela escola e, na época, foi mencionado o nome do Adam. Mas eu não cheguei a ver nada.

Adam: Não me lembro de nenhum incidente em que tivesse me despido, mas não é improvável.

Bono: O Adam era conhecido por se despir e passear nu pelos corredores da escola.

Adam: Nessa época, tornou-se claro para o professor encarregado do internato, Donald Moxham, que, embora fosse uma pessoa muito sensata e equilibrada não tinha grande interesse pela escola. Ele era um homem facilmente irritável e acho que não gostou em saber disso. Eu era apanhado por coisas insignificantes, mas ele ficava sempre irritadíssimo. Devo dizer que, apesar de sua posição, ele era muito tolerante, pois era muito empenhado como professor e em dar oportunidades às pessoas. Até tinha nos disponibilizado um espaço para ensaiarmos, entre muitas outras coisas. Por isso, de certo modo, estávamos na mesma onda, mas ele acabou dizendo que achava que eu tinha “ultrapassado” o sistema escolar e não havia razões para continuar lá gastando recursos valiosos, o que foi uma maneira muito educada de me por para fora. Eu poderia ter protestado e talvez tivesse ficado lá. Mas ele me deu uma escolha. Disse: “Os exames que te permitirão ter o diploma do secundário estão na porta, se quiser, pode vir fazer”. E eu, com dignidade, disse: “ Eu também não quero fazer a porcaria dos exames!” Foi uma mentira, pois sabia que não ia obter bons resultados. Arrogância juvenil.

Edge: O Adam se tornou nosso agente e mandou fazer cartões de visita. Durante algum tempo, o Adam e o Bono foram, sem dúvida, os mais vocais do grupo, já que eu e o Larry éramos muito novos. O fato do Adam conhecer termos exóticos como ‘gig’ (atuação) e ‘riff’ (seqüência repetitiva de notas) dava a ele uma certa autoridade. Acho que nós até usamos a palavra ‘rift’ até ele nos corrigir. Estávamos bem impressionados.

Adam: Embora eu dirigisse a banda, o que quer que isso significasse, acho que estava sendo incentivado pelo Bono. Ele sabia sempre o que queria e o que a banda era capaz de fazer. Mas eu tinha mais tempo disponível do que os outros, e, além disso, em minha casa as regras para usar o telefone eram mais liberais. Acho que o Bono não podia fazer telefonemas em casa. O pai dele era muito rígido. Por isso era eu que telefonava para todas as pessoas que achava que podiam nos ajudar. Havia um lugar chamado The Spinning Wheel, na Mary Street, onde costumava ter atuações aos sábados e domingos à tarde e eu ia para lá conversar com as pessoas. Naquela altura, eu era apenas um cara de pau e qualquer pedacinho de informação ou contato com o mundo do espetáculo me fazia andar motivado dias a fio.

Edge: Começou a levantar uma questão sobre se meu irmão fazia ou não parte da banda. Estava tornando evidente que, como grupo de quatro elementos, nos dávamos bem. Como compúnhamos as músicas em quatro, começou a se desenvolver uma forma natural de tocarmos juntos. Mas foram momentos difíceis, porque eu me sentia relutante diante da idéia do Dick não fazer parte do grupo. Durante algum tempo, não quis ver a sensatez dessa atitude.

Larry: O Dick era um cientista e eu não percebia porque razão tínhamos um cientista na banda. Eu era novo, e não era muito diplomático. Desculpa ai Dick.

Adam: Éramos muito sensíveis em relação ao fato de termos dois irmãos na banda. Um deles andava na escola com a gente e era, por assim dizer, um dos nossos. Nessa altura, assim como agora, tudo se resumia: “Somos uma banda? Quem pertence à banda? O que isso significa?” O Dick pertencia, obviamente, a uma geração diferente. Já estava na Trinity College e não tinha as mesmas ambições que nós. Era um excelente aluno, por isso, era impossível que tivesse o mesmo empenho que nós na banda. Nem sempre podia ir aos ensaios, não fazia muitas coisas que nós fazíamos e não estava presente em discussões importantes. Havia ainda outra coisa atrativa em ficarmos reduzidos a uma banda de quatro integrantes. Era mais intenso, só um guitarrista fazendo power chords e não havia excessos. Começamos a nos preocupar mais com a nossa imagem. Tiramos idéias de revistas como a Hot Press e a NME, de alguns grupos punk, começamos a analisar o trabalho artístico deles, e começou a se tornar evidente que o Dick não se encaixava na banda. A barba também deve ter influenciado.

Larry: As coisas começaram a ficar complicadas. Um dia, houve um pequeno desentendimento. O Dick se virou para mim e me deu um soco na barriga. Acho que foi a última gota.

Adam: Foi uma transição difícil, porque ninguém queria ofender ninguém. O Edge não tinha voto na matéria, devido aos conflitos de interesses. Acho que não tomou o lado de ninguém. Era algo que eu, o Larry e o Bono tínhamos que resolver.

Bono: Não me lembro de como é que tudo se desenrolou.

Edge: Telefonei ao Dick e contei-lhe a novidade. Dei uma grande volta à história. Disse-lhe que havia um novo projeto chamado U2, que só tinha quatro elementos. Que os Hype iam acabar.

Adam: O momento exato em que nos tornamos U2 foi numa mostra de talento em Limerick, patrocinada pela Harp Lager, no dia de Saint Patrick, em Março de 1978. O prêmio era 500 libras (cerca de 635 euros) e um contrato discográfico. Tínhamo-nos inscrito como The Hype e ocorreu-nos que, se ganhássemos, esse seria o nome pelo qual passaríamos a ser conhecidos. Por isso, tivemos de mudar de nome antes do concurso.

Bono: Os Hype deram um espetáculo à meia-noite no Project Arts Centre.Um espetáculo sério, numa verdadeira sala de espetáculos de Dublin! Depois da atuação fomos celebrar. Acho que não houve muito descanso nessa noite. No dia seguinte, tínhamos de acordar cedo para apanhar o trem para Limerick. Alguns integrantes dos Village foram conosco. Foi uma animação ir de trem com os nossos colegas para ir atuar num lugar onde havia pessoas ligadas ao mundo da música. Era Rock ‘n’ roll!

Larry: Eu e o meu velho chegamos à Connolly Station vinte para as duas e reparamos que o único trem que ia para Limerick saía às 14h da Houston Station. Lembro-me de ele ter começado a resmungar: “Você é um grande idiota!” enquanto íamos correndo ao longo da linha de regresso ao carro. Por pouco não apanhávamos o trem.

Adam: Foi uma festa e tanto! Estavam lá o Gavin, o Guggi, o Strongman e o Pod. E a Maeve O’Regan.

Larry: Nunca tinha ficado num hotel. Acho que partilhei o quarto com o Pod e o Strongman. O Bono dividiu o quarto com a Maeve O’Regan. Achei aquilo uma loucura. Ele estava dividindo o quarto com uma garota. Sentia-me completamente intrigado com aquilo, pois sabia que os meus pais não iriam aprovar.

Bono: Sempre tive amigas que não eram minhas namoradas. No topo da lista estava a Maeve. Éramos verdadeiras almas gêmeas. Falávamos da vida e de poesia, de sexo e de fé, de amor e de medo, e “de todas as coisas que nos mantêm na misteriosa distância entre um homem e uma mulher”. Lembro-me que queria mesmo falar com ela. Acho que tinha alguma coisa planejada. Mas éramos amigos e, por isso, não iria acontecer nada entre nós. Mas ela foi dar um passeio com o Adam e não voltou para conversar comigo sobre poesia, política ou outra coisa qualquer. Fiquei magoado e compreendi o poder do Afro, mesmo que fosse um Afro invertido. Isto porque o Adam tinha um cabelo que deixaria o Michael Jackson orgulhoso. Além disso, sabia acender cigarros e bater levemente o cigarro para fora do maço. Naquela altura, o mais provável era eu pegar fogo em mim mesmo.

Eu devia parecer uma pessoa muito segura de si mesma. E o tinha sido, quando era mais novo, mas a autoconfiança não resiste a tudo. Nada de bom surgiu depois disso. Acho que a arte é uma tentativa de a pessoa se identificar. Se temos a certeza de qual é o nosso lugar no mundo, não existe qualquer razão para tentá-lo descobrir. Eu já fui uma pessoa muito segura de mim mesmo, mas, depois, a minha mãe morreu e a minha segurança se foi. Quando tinha 17 anos, recuperei alguma confiança, porque descobri o que queria fazer na vida. Até sou capaz de ter atingido um certo nível irritante novamente. Mas não muito. Porque agora já sabemos o tamanho da queda e essa idéia nunca desaparece. Mas eu ainda andava tentando resolver esse problema.

De qualquer forma, no palco demonstrava grande segurança. Alguma vez viram uma pessoa desastrada e sem graça que consegue nadar maravilhosamente? Normalmente, não passa de uma pessoa desajeitada que esbarra contra as mesas e cadeiras e tropeça em sacos, mas quando entra na água tudo se transforma. Comigo acontece o mesmo. Porque estou fazendo aquilo que gosto. É uma sensação fantástica. A música me deu muita confiança.

Adam: O concurso era uma sala com um palco enorme, um sistema de som e luzes e todos aqueles músicos das showbands fazendo o que eles sabem fazer, todos à espera de conseguir um contrato discográfico, alguns tipos mais novos e mais punks, e nós.

Larry: As apresentações iam começar cedo, às seis da tarde. O lugar estava lotado. Assistimos à apresentação das outras bandas e nos sentíamos pouco confiantes.

Edge: Não fazia idéia do que é que eles esperavam daquele espetáculo. Achei que ia ser um concurso terrível de amadores e que o vencedor ia ser um grupo que conseguisse cantar ‘Auld Lang Syne’ e beber um copo de água ao mesmo tempo. Mas, quando chegamos lá, encontramos o Jackie Hayden, juiz da CBS Ireland, que era um tipo todo modernão, e, por isso, achamos que as coisas podiam correr melhor do que pensávamos. Entretanto, vimos algumas atuações antes da nossa e achamos que eram todos músicos muito bons. Muitos deles estavam tocando versões de outros grupos, mas outros apresentaram originais. Achei que as músicas não eram grande coisa, mas eles sabiam tocar e cantar afinados. Estava um tanto nervoso e achei que íamos nos estrepar na primeira dificuldade.

Bono: Havia bandas que sabiam acompanhar o ritmo, eram afinadas e pareciam muito seguras, tudo o que nós não conseguíamos ser nem fazer. Mas algumas bandas têm tudo “aquilo” mesmo. Nós só tínhamos “aquilo”.

Edge: Acho que tocamos três músicas nossas. Não demoramos mais de três minutos, eram coisas simples.

Larry: Tocamos ‘Street Mission’ e mais umas músicas.

Adam: Acho que tocamos ‘Life On A Distant Planet’ e uma coisa chamada ‘The TV Song’. Chamava-se assim porque tinha um som parecido com o da banda television. Era melódica, a meio-tempo e o principal atrativo era o fato de sabermos tocá-la até o fim.

Edge: Lembro-me apenas de termos arrasado. Às vezes, sente-se que a sala vibra. Me fez lembrar o primeiro concerto que demos no ginásio da Mount Temple e eu conseguia ver no rosto das pessoas que tínhamos estabelecido uma ligação. Me fez sentir muito bem, mas ainda não fazíamos idéia de que iríamos ganhar.

Larry: Todos os que estavam conosco em Limerick acharam que nos tínhamos saído muito bem. Não tivemos grande reação por parte do público, mas fomos a única banda com um repertório só de originais. Depois da atuação, nos sentamos junto do público. Subiram ao palco mais alguns grupos e depois houve uma pausa enquanto era feita a votação. Não me lembro de qual era o processo de votação, acho que não era nada de muito complicado, mas eu estava tão entusiasmado que nem sequer pensava nisso. Os East Coast Angels ficaram em terceiro lugar. A Maeve O’Regan virou-se para mim e disse que íamos ficar em segundo ou primeiro lugar. E eu disse-lhe que ela não tinha entendido o sistema de votação. Entretanto, um grupo popular só de garotas ficou em segundo. Eu já estava convencido de que tínhamos perdido. E a Maeve disse: “Vocês ganharam!” E tinha razão. Nem conseguíamos acreditar. Quinhentas libras e a oportunidade de gravar um single. Melhor do que isto era impossível.

Adam: Foi uma das raras ocasiões em que o meu pai esteve presente. Ele tinha parado em Shannon e foi assistir ao espetáculo. Não queríamos acreditar que tínhamos vencido. Eu achava que as nossas probabilidades eram as mesmas de quem joga na loteria, ou isso. Mas foi estrondoso termos realmente ganho. Lembro-me de ter agarrado na cadeira que estava à minha frente e de tê-la espatifado no chão. Mesmo em cima do pé do meu pai. E ele nem percebeu porque, pois não sabia que tínhamos mesmo vencido.

Edge: O pessoal ficou doido. O Pod saltou bem alto e aterrou em cima de mim. Quase me partia a perna com a excitação. Devido à forma como o concurso estava organizado, o mais provável era que nem sequer tivéssemos sido colocados, por isso, saltamos das garras da derrota e da ignomínia para a vitória. Mal podíamos acreditar. Fiquei em estado de choque. Não tínhamos idade para nos divertirmos noite fora, mas acho que ninguém dormiu naquela noite. O Adam, sendo o mais velho e aquele que se comunicava melhor com os adultos, foi receber o cheque. O pai do Adam estava perto dele e ficou com o dinheiro por uma questão de segurança. E foi assim. Foi uma grande afirmação termos vencido aquele concurso, embora eu não soubesse até que ponto havíamos sido bons, nem como tinha sido a competição. Mas, naquela fase, foi muito importante vencer para levantar a moral e para que todos acreditassem no nosso projeto.

Larry: Houve uma espécie de desfile na manhã seguinte e nós ficamos assistindo da varanda do hotel. Íamos ter de ficar o dia todo em Limerick por causa dos horários dos trens. Ainda éramos muito novos para nos servirem bebidas nos bares, por isso, passamos a tarde inteira na feira popular local. Não imaginamos até que ponto o fato de termos vencido em Limerick iria mudar as nossas vidas.

Adam: De certa forma, essa vitória lançou-nos num novo curso. Foi tudo muito amador, mas para nós era muito real e, quando nos apercebemos, o contrato discográfico não era bem um contrato discográfico. Não havia nada que favorecesse o artista. Mas já estávamos um passo à frente.

Bono: Na viagem de regresso à casa, alguém tentou atirar o troféu pela janela do trem, porque parecia uma taça de um campeonato de golfe.

Adam: Depois disso, os Hype de cinco elementos ainda fizeram mais uma apresentação, na qual se despediram do Dick. Foi no salão da igreja presbiteriana, em Howth. Parecia uma daquelas ocasiões em que se vai tomar chá com o vigário. Não tinha nada de ar de rock ‘n’ roll. Mas não deixou de ser uma noite divertida para todos nós.

Bono: Naquela noite atuaram quatro bandas e o Adam entrava em todas! Tocou com os Hype, depois ele e o Edge apoiaram o Gavin e o Guggi no primeiro espetáculo dos Virgin Prunes e, por fim, tocou algumas músicas com a nova banda do Steve Averill, os Modern Heirs. E com o U2, claro. O Adam tinha uma coisa fantástica, sabia sempre o que queria e tinha a coragem de o dizer. E tudo o que ele queria era estar numa banda e ir até o fim.

Edge: Foi um momento de virada. Fizemos versões de outros artistas como Hypes e depois regressamos como U2 com um repertório de originais. O Dick ficou um tanto desiludido por ter chegado o fim. Acho que o aceitou com um certo fatalismo. Não houve lágrimas nem cenas. Mas, quanto a mim, houve uma certa tristeza. Ele era meu companheiro e meu irmão. Vivemos muito unidos durante muitos anos e éramos companheiros na música. Agora, íamos seguir caminhos separados. No entanto, tinha de reconhecer que era o melhor para todos. A nossa banda de quatro integrantes era mais intensa. Esta nossa nova versão possuía uma harmonia e um entusiasmo que eram muito apelativos. Estávamos ansiosos pelas próximas músicas, pelas próximas atuações. Tínhamos apanhado a febre do Rock ‘n’ Roll.

Hoje em dia, o Dick passa a maior parte do tempo fazendo pesquisa no campo da ciência informática. Vemo-nos com regularidade e ele continua a tocar guitarra e a estar envolvido no mundo da música. Tenho certeza de que sente alguma mágoa pelo trem ter saído da estação sem ele. Ele teria adorado fazer parte de tudo aquilo conosco. Mas também sei que não está sempre pensando que as coisas poderiam ser diferentes. Já naquele tempo, existia no U2 uma harmonia que os Hype nunca tiveram. Não teria sido a mesma coisa com dois guitarristas. Ele tocava com tanta sutileza, de forma tão singular. É absolutamente brilhante. No início, tocava guitarra muito melhor do que eu. Foi ele quem me ensinou a tocar, mas o seu estilo natural foi sempre diferente. Ele é uma pessoa mais do tipo intelectual e isso se podia notar na sua forma de tocar.

Adam: Me lembro do significado de quando nos tornamos o U2 naquela noite, de termos ficado só os quatro. Era um sentimento de estabilidade, estávamos onde devíamos estar, tocando o nosso próprio material e estava tudo bem. Na semana seguinte: Top of the Pops!

*Agradecimentos aos novos colaboradores da tradução: Nonata, Juliana Oliveira, Cris Flor, Camila, Aleh, Cris Kite, Su Scout, João Filardi e Huanita.

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