Começo o último texto desse especial pedindo desculpas.
A primeira desculpa é porque ele simplesmente ficou muito aquém do que deveria ter sido. Seriam dez textos, que viraram apenas quatro. Faltou muito do que queria dizer, muito do que queria contar. Me lembrei com extrema tristeza – e uma boa dose de vergonha – do aniversário do Bono de dez anos atrás, quando ele comemorou seus 50 anos e ganhou cinquenta posts de presente. Queria ter escrito sobre a família maravilhosa que ele formou, sobre os outros projetos que têm, sobre a sua amizade com os membros da banda, sobre o seu ativismo, sobre os óculos, sei lá até sobre o cabelo que às vezes – ultimamente quase sempre - aparece meio estranho. Mas não deu, a rotina de estar em home office, as notícias e mais outras coisas atrapalharam.
Quem sabe se um dia algum leitor aí se interessar eu crio uma coluna sobre o Bono por aqui.
Continuo no pedido de desculpas. Desculpem-me por ter escrito os textos em primeira pessoa, pode soar egoísmo alguém se sentar diante de uma tela e desenrolar um pensamento seu e desdobrar para todos como se fosse uma verdade absoluta.
Então abro o texto que fecha – que frase péssima – o especial, continuando as desculpas, mas dessa vez o pedido vai adiantado mesmo. Vou tentar escrever em nome de NÓS, dos fãs que hoje em meio ao caos celebram a felicidade. Esse texto sem pilhas de livros, de pesquisas, um milhão de abas abertas para referências e sem a minha trilha sonora certamente vai ser o mais complicado, porque ele vai tentar falar sobre o inexplicável e o intangível. A primeira ideia era terminar com uma lista de “60 motivos” para amar o Bono, mas eu achei isso um pouco batido, levemente revista adolescente dos anos 90, e já havia rolado como dito acima nos 50 anos dele. Aí pensei em uma playlist de 60 músicas do U2 para se ouvir no dia de hoje ou 60 músicas que influenciaram Bono, mas aí já acordamos com a surpresa que o aniversariante mesmo fez a sua lista. Então resolvi dobrar a aposta e simplesmente falar de amor.
Alguém conhece algo mais intangível ou mais forte do que um sentimento, seja ele bom ou ruim? Nada é tão inexplicável quanto amor, raiva, ódio, admiração. Kant na filosofia já tentou explicar o tal do juízo de gosto, mas vamos combinar que quando tentamos estudar ou explicar porque amamos pudim sem calda, música ruim, café amargo ou um bando de homens que cantam em um a língua que não é nossa, que nem sabe quem somos e moram do outro lado do oceano isso se torna ainda mais chato. Amar é simplesmente amar.
Amar é ser grato, amar é tentar entender, é discordar, é querer dar e receber carinho, é fogo que arde sem se ver... Ops, peraí. Amar é querer estar perto, é querer sentir o cheiro, é querer a felicidade. Então como podemos dizer que amamos a alguém que está em uma realidade tão distate a nossa? É sabendo que ele não está. Amamos alguém mesmo que não seja fisicamente. Amamos alguém que é capaz de traduzir para nós o que nem sabemos que precisa ou como é ou se é traduzível. Nós podemos amar alguém que nos empresta sua alma, seu coração e seus olhos para que nós possamos entender a nós mesmos e o mundo que nos cerca. Nós podemos amar alguém que chega nos nossos ouvidos e nos faz confiar que o mundo pode ser melhor, que o amor supera tantas coisas, que a gente pode ter uma sociedade mais igualitária, que precisamos aprender a aceitar as diferenças, que somos fortes, fracos, únicos, diferentes.
Mas que às vezes também faz umas musiquinhas meio esquisitas, fazer o que? O amor supera, né?
Amar é ser fascinado, fascinado por como em meio a milhares de pessoas alguém pode ser somente seu por alguns segundos, e não importa a qual distância você esteja. Amar é aquele quentinho no coração do abraço que não é real, mas é verdadeiro ao extremo.
Amar é admirar. É se sentir orgulhoso de amizades que passam a barreira de 40 anos. É querer ter um amor de adolescência que dura com brilho nos olhos até quando você chega finalmente a o que dizem ser a velhice. É amar a mania de ser um sabe-tudo insuportável, que parece querer entender de tudo ao mesmo tempo, e fazer algumas coisas pela metade. E daí que nem toca mais a guitarra que nunca tocou tão bem assim? Que o pianinho sai desafinado de vez em quando? Ou que insiste em tocar sempre as mesmas músicas? A gente admira tudo como fosse a primeira vez.
Amar é estar sentado escrevendo, lendo ouvindo e pensando sobre essa pessoa e simplesmente não conseguir chegar a lugar nenhum a não ser uma única palavra: GRATIDÃO. Gratidão por podermos estarmos vivos ao mesmo tempo que você, gratidão por ser o fio que nos conduz a conhecer pessoas incríveis – está bem e algumas nem tanto – na nossa vida. Gratidão pelos perrengues que depois se transformam em momentos únicos. Gratidão por ser um pouco nosso pai, um pouco o nosso amor correspondido e não correspondido, um pouco nosso irmão mais velho, um pouco nosso tio bêbado engraçado no final da festa, um pouco arrogante, um pouco gente como a gente, um pouco mãe, um pouco refúgio, um pouco luz, um pouco escuridão.
Amar é dizer obrigado por você ser quem é.
Parabéns, Bono.
PS: você é dono de muito mais de 60 músicas que salvaram as nossas vidas. Pode ter certeza.