The Edge dá entrevista exclusiva à Rolling Stone
The Edge dá entrevista exclusiva à Rolling Stone
09 de janeiro de 2017
The Edge dá entrevista exclusiva à Rolling Stone
Rômulo
Editor-chefe do U2 Brasil

Desde sua formação em 1976, o U2 tem evitado de forma agressiva, qualquer movimento que faça menção à nostalgia. Mas esse ano eles finalmente estão olhando para trás, e levando a sua obra prima de 1987, The Joshua Tree, para uma turnê em estádios através da América do Norte e da Europa, em homenagem ao aniversário de 30 anos do álbum. É a chance para a banda se reconectar com os fãs, depois de uma recepção um tanto quanto desapontadora para o seu LP de 2015, Songs of Innocence, e nos dá uma chance de seguir na estrada enquanto continua a dar os toques finais no seu próximo álbum, Songs of Experience. Algumas semanas antes do shows serem formalmente anunciados, o guitarrista do U2, The Edge, telefonou para Rolling Stone para falar sobre a turnê, reviver algumas músicas raras no palco, seu próximo álbum, Donald Trump e muito mais.

Você pode me dar algum contexto sobre como essa turnê aconteceu?

Bem, quando saímos da turnê passada, a Innocence and Experience Tour, nós nos voltamos direto para terminar o segundo álbum desse set, Songs of Experience,  o qual iremos terminar completamente os toques finais em algumas semanas, agora no final do ano. E então a eleição aconteceu e então o mundo mudou. Então nós ficamos... "espere um segundo - vamos nos dar um tempo para pensar nesse álbum e como ele se relaciona com o que está acontecendo no mundo". Isso porque começamos a escrever, quer dizer, 80% dele foi feito antes de 2016, mas a maior parte dele foi escrito na primeira parte de 2016, e agora, como eu acho que você via concordar, o mundo é um lugar diferente.

Você está falando sobre Trump e Brexit?

A eleição de Trump é como um pêndulo que inesperadamente deu uma volta em outra direção. Então, nós estávamos olhando para o aniversário do The Joshua Tree, e uma coisa levou a outra, porque as coisas meio que viraram um círculo. O álbum foi escrito no meio dos anos 80, durante a era Reagan - Thatcher da política dos Estados Unidos e do Reino Unido. Foi um período bem turbulento. Thatcher estava no processo de parar com as greves dos mineiros; muita coisa estava acontecendo na América Central. Parece que estamos voltando para lá, e um certo modo. Eu não acho que nenhum outro trabalho nosso voltou à tona assim desse jeito. Então foi como: "Wow, essas músicas têm um novo significado agora e uma nossa ressonância, as quais ele não tinha há três, quatro anos." Então foi como se houvesse um insight, realmente o pensamento que tínhamos em colocar o segundo álbum em pausa para ter certeza que era realmente aquilo que queríamos dizer.

Então nós dissemos: "Olha, vamos fazer os dois. Nós realmente podemos celebrar esse álbum, que renasceu nesse contexto, e podemos ter uma chance de pensar acerca dessas músicas e ter certeza que é isso que queremos colocar". Então, as duas coisas meio que coincidiram e decidimos que iríamos fazer alguns shows. Nós nunca nos demos a oportunidade de celebrar nosso passado porque somos uma banda que olha para a frente, mas eu acho que sentimos que esse era um momento especial, e que esse é um disco especial. Então nós estamos tirando esse momento para reagrupar e pensar no álbum que já tem tantos anos, mas ainda parece relevante.

Vocês irão tocar o álbum em sequência nos shows?

Eu acredito que iremos, e eu digo "acredito que iremos" porque é certamente o que estamos pensando agora. O show não necessariamente irá começar com a "Faixa Um, Lado Um",  "Where the Streets Have No Name", porque nós sentimos que precisamos construir esse momento, então ainda estamos no meio de ver exatamente qual seria a ordem, mas sim. Iremos tocar o álbum em sequência.

Os fãs ficarão extasiados. Existem muitas músicas que vocês não tocaram em décadas. E então, existe "Red Hill Mining Town," a qual vocês nunca tocaram. 

É verdade. Eu tive alguns dias de trabalho numa sessão de estúdio onde eu estava ouvindo essa música e trabalhando nas partes de guitarra para isso, a qual eu não tinha pensando por muitos anos. Essa música é um tapa na cara em alguns sentidos no que se refere ao que está acontecendo agora em toda a União Européia, por muito tempo em várias gerações. Não é exatamente uma repetição de Winter of Discontent, mas é um desses problemas que vivem voltando. Parece que a política está tão polarizada em várias partes do mundo em desenvolvimento, em uma extensão que eu acho preocupante. Eu tenho certeza que muitas pessoas também. Esses dias são difíceis, tempos sombrios e eu pessoalmente odiaria que estivéssemos voltando a eles.

Por que você acha que essa é a única música do álbum que vocês nunca se importaram em tocar ao vivo? É difícil para tocar ou para Bono cantar?

Eu acho que essa é provavelmente uma das únicas músicas que, de acordo com o tempo e arranho, nunca encontramos um lugar para tocar ao vivo. É engraçado, às vezes ótimas músicas... Pensar num show ao vivo, é como pensar num ecossistema. Você tem nichos para encher. Existem músicas ligeiras, rápidas, dramáticas e essas são cruciais. Existem muitas músicas que são mais "medium tempo", as quais não importa o quão fantásticas elas podem ser, algumas vezes você não consegue encontrar um lugar para elas. Então eu não acho que tenha sido nada mais complicado do que isso. Mas ouvindo novamente, eu fiquei... "wow, isso é realmente...".

Você talvez pode não saber disso, mas alguns dias antes de terminar o álbum, "Red Hill Mining Town" era a música que iria ser nosso primeiro single. Nós fizemos um vídeo para ela com Neil Jordan, e estávamos muito confiantes sobre isso. E então, quando as semanas se passaram, nós voltamos ao nosso objetivo, nossas visões começaram a mudar e se tornou "With or Without You", e eu acho que estávamos corretos.

E então tem "Exit" e "Trip Through Your Wires," as quais você não têm tocado desde os anos 80. E então tem "In God's Country", que só foi tocada de forma acústica e apenas algumas vezes. Será ótimo ouvi-las novamente.

Sim. Elas são todas são diferentes. Essa é a coisa sobre The Joshua Tree. É um álbum amplo, muito CinemaScope. No momento, estávamos pensando em termos cinemáticos. Quer dizer, muito das fotografias que vão com o álbum têm um foco bastante cinemático. E nós estávamos pensando em músicas desse ponto de vista. E também inspirações literárias e referências. Em fato, nosso título original de trabalho de "Exit" foi "Executioner's Song" porque nós estávamos usando um monte de literatura como nosso ponto inicial para as músicas, em termos de apenas levar o álbum em uma direção levemente diferente.

Nós definitivamente estávamos caindo nos braços da América no sentido de que, como banda, punk rock foi muito sobre estabelecer uma forma única de música que não tenha sido inspirada ou influenciada por música americana. Se você ouvir a nossos álbuns mais antigos, você pode ouvir muito da influência da música contemporanea alemã. Muitas bandas do Reino Unido estavam ouvindo a mesma música. The Joshua Tree  foi o primeiro álbum no qual nós conscientemente fomos "Ok, nós passamos quatro álbuns pensando sobre Europa, Irlanda... mas vamos olhar para as raízes disso que somos inevitavelmente parte". E tudo isso era americano.

Então nós olhamos para a música americana. Nós olhamos para o blues. Nós olhamos para o Novo Jornalismo. Eu lembro que eu e Bono estávamos lendo Flannery O'Connor, os autores do sul. Foi um esforço coletivo para olhar através do Atlântico e começar a explorar a América. Quer dizer, para alguém da Irlanda, foi uma vasta fonte de ideias e aspirações e inspirações e gerações e gerações, sendo a América a Terra Prometida. Nós estamos olhando para isso, mas também olhando para o que a América foi. Eu li sobre os Soledad Brothers. Eu li sobre os Black Panthers. Nós estávamos explorando a América de todos os ângulos. E todo esse tempo houve um momento Reagon quando, em alguns momentos, a visão do que a América seria, pareceu sob ameaça. A América de Thomas Jefferson, a América de John F. Kennedy, esses são os visionários que estavam falando sobre os ideais do que a America poderia ser. Nós estávamos caminhando com essas ideias e agora nós estamos aqui novamente. É loucura.

Quais músicas vocês irão tocar na parte "não Joshua Tree" dos shows?

Obviamente, toda vez que nos temos algo ao vivo para fazer, nós procuramos estabelecer uma linha, um núcleo cinemático que devemos seguir. E nós somos mimados e sortudos que temos muito o que escolher. Mas estando ainda no começo do processo, é ainda difícil pra mim dizer exatamente o que estamos buscando. Mas eu posso dizer que as músicas mais antigas estão sendo consideradas, e iremos tocar de acordo com o tema principal. Sabe, nós iremos fazer shows na América. Iremos fazer shows na Europa. Mas certamente nos shows americanos, eu não tenho dúvidas que muito vai ser vai ser focado no mito americano que estávamos escrevendo sobre durante o Joshua Tree.

Você acha possível tocarem algum B-side do álbum como "Wave of Sorrow" ou "Luminous Times"?

Nós fizemos alguns B-sides em nossos shows anteriores até hoje, e é difícil de alguma maneira para uma canção fazer parte do set porque não é sobre a qualidade dela. É sobre o que você tem que tirar para criar espaço para isso. Nós somos ambiciosos na medida em que sempre queremos atender o que chamamos de nossos uber-fãs que já viram diversos shows. Eles querem ver algo novo que nunca viram antes, algo obscuro e único. E nós sabemos disso. Nós fazemos o máximo para tornar isso possível. Mas também estamos conscientes de que a grande maioria das pessoas só nos viram uma vez, ou algumas vezes antes. Há uma longa lista de músicas clássicas que eles querem ouvir. É esse equilíbrio.

Muitas vezes é divertido ter algo do passado que não temos tocado normalmente e reinterpretá-lo, então, sem dúvidas estaremos olhando para isso. Mas eu não acho que vamos colocar uma enorme ênfase nas canções obscuras e pouco ouvidas. Eu acho que teremos algumas com certeza. Nós mencionamos "Exit," "Trip Through Your Wires," "In God's Country" e "Red Hill Mining Town." Quero dizer, essas são quatro canções. "Red Hill Mining Town" nunca foi tocada antes e as outras três raramente são ouvidas. Então, lá você vai. Eu não sei. Eu não descartaria B-sides.

Eu acho que duas canções que os fãs estão quase morrendo para ouvir são "Acrobat" e "Drowning Man." Elas nunca foram tocadas ao vivo. Há alguma chance disso acontecer finalmente?

Isso é muito interessante. Eu não sabia que os fãs estavam interessados em "Drowning Man." Quero dizer, "Acrobat", com certeza, eu acho. Era uma daquelas peças mais dramáticas do Achtung Baby. Mas isso é interessante. Eu tomarei nota sobre. Nós sempre queremos ouvir nossos fãs porque em nossa experiência, os fãs raramente estão errados. Há algo para o que eles dizem, então, eu tomarei nota sobre isso. Eu não estou dizendo que definitivamente faremos isso, mas nós estamos nessa maravilhosa situação onde nós temos uma tela em branco.

Eu acho que os fãs também sentem falta dos momentos nos shows onde você assume a liderança em uma música, como "Numb" e "Van Dieman's Land." Costumava sempre ser um momento Edge onde você fazia uma.

Sim. Você sabe, Eu canto muito como você sabe, quase sempre como apoio vocal. Mas Bono é realmente aquele que me empurra para pegar um vocal. Eu estou bem cantando assim, mas também o fato de que nós temos um grande cantor na banda. Eu acho que a oportunidade apenas não parecia ser a melhor opção nas últimas turnês. Mas eu não descartaria ela também.

Eu vi que vocês estarão tocando em Bonnaroo. Isso deve ser divertido. É um tipo muito diferente de show para vocês.

Sim. Nós não tocamos em festivais já faz alguns anos, mas nós fizemos vários festivais no começo, e eu sempre me lembro deles com carinho por várias razões. Há um tipo de aspecto gladiatório para um festival que sempre mantém você em seus dedos do pé de uma boa maneira. Há também a oportunidade de esfregar os ombros com seus pares e estar nos bastidores com outros artistas e outras bandas. Uma das desvantagens de fazer seus próprios shows é que você tende a não ter estas oportunidades normalmente. Nós fizemos várias amizades no começo fazendo shows com Simple Minds e Eurythmics e outras várias bandas. Há uma parte importante nisso para mim, eu estou ansioso para isso.

Como vai ser o palco nesses shows da Joshua Tree? Será como o original em 1987?

Eu não acho que queremos ser tão servil, mas ao mesmo tempo nós queremos reconhecer algumas das ideias estéticas que fizeram parte do disco. Eu não acho que nós vamos nos lançar em reinventar, mas nós definitivamente iremos pegar essas ideias estéticas e atualizá-las um pouco. Esta é a The Joshua Tree 2017. Não é a The Joshua Tree 1986.

Ainda, eu tenho certeza que a palavra "nostalgia" vai ser lançada ao redor em conexão com essa turnê. Como você se sente sobre isso?

Bom, como eu disse, eu acho que o importante para nós é que não é realmente sobre nostalgia. Há um elemento de nostalgia que nós não podemos evitar, mas não é motivado por um desejo de olhar para trás. É quase como se este álbum tivesse completado o círculo e estivéssemos lá novamente. É tipo conseguir a relevância de novo que estamos certamente conscientes.

O próximo álbum será Songs of Experience ou é possível que seja algo completamente diferente?

Não, eu acho que é Songs of Experience. Quando eu digo que está quase pronto, nós definitivamente queremos aproveitar esta oportunidade para pensar sobre isso, ter a certeza que é o que queremos lançar dada as mudanças que ocorreram no mundo. E talvez um pouco irá mudar, mas nós absolutamente queremos tomar esta chance apenas para reconsiderar tudo. E quem sabe? Podemos até escrever algumas canções novas porque essa é a posição em que estamos. Nós nos demos um pouco de espaço para a criatividade.

Você acha que quando a Joshua Tree Tour terminar, a Innocence and Experience Tour irá voltar de novo com o mesmo cenário e tudo como da última vez?

Nós sentimos que a turnê não terminou. Então, neste momento, nós adoraríamos terminá-la. Eu imagino que será muito similar. Mas eu odiaria tentar olhar tão longe para o futuro. Essa é a suposição do trabalho no momento, mas as coisas podem mudar e nada está escrito na pedra até agora. Mas nós gostamos daquela turnê e aquele projeto ainda não está completo. Está vivo ainda em nossas mentes criativamente.

Você tem alguma ideia de como o próximo álbum será distribuído? Houve tanta atenção prestada sobre a distribuição do último.

Meu plano é que Bono e eu entrássemos na casa de cada um e colocasse o CD embaixo de seus travesseiros [risos]. Mas, infelizmente, isso não parece estar recebendo muito apoio do resto da banda. Mas, não, de novo, é muito interessante como a forma de distribuição da música e promoção e marketing tem tornado-se um tumulto ao longo dos últimos anos. O que parecia ser as ideias mais inovadoras há seis meses não parecem ser mais novas ou inovadoras. Além disso, eu estou ciente de que as vendas de discos de vinil estão passando pelo telhado. É muito louco ver isso. Isso fala sobre tantas coisas sobre o que o artefato, o objeto de um disco de vinil significa para as pessoas versus um download digital, um arquivo. As pessoas, no final, têm uma conexão emocional com um bom disco e com o artista.

Um arquivo digital é... Olhe, a conveniência é maravilhosa. Se eu estou sendo honesto, eu ainda tenho minha coleção de vinil, mas eu uso os arquivos digitais 90% do tempo. Mas eu nunca desistiria de um vinil. E por isso há uma necessidade de ambos, e eu acho um tipo de tranquilizador que, no meio da conveniência de ser rei, ainda há esta conexão profunda e emocional que as pessoas têm com o corpo do trabalho que é o álbum. Então, quem sabe? Nós ainda estamos tentando descobrir como todos os outros.

O que eu acho reconfortante é que a cultura musical e a música ainda está na vanguarda. As pessoas estão aproveitando e se deleitando com ela e se voltando para ela por todos os tipos de razões. Eu estou interessado em ver se, neste mundo pós-verdade, a música se reconecta com os assuntos de ativismo-protesto que teve por tantos anos e parece ter perdido recentemente. Eu acho que o aspecto da música sempre foi, em minha cabeça, uma parte importante e crucial do que me atraiu, e porque eu acho que muitas pessoas são atraídas por isso. Então, eu sinto que esse é um momento onde a música pode passar por uma espécie de renascimento e estou muito animado para ver o que as crianças em suas garagens em toda a América do Norte e Europa estarão escrevendo sobre e lançando nos próximos anos. Eu acho que é hora de voltar a falar disso.

OK, última pergunta:  final question: Você acha que vocês farão uma turnê de aniversário do Achtung Baby em 2021?

(Risos) Sem planos, mas nunca diga nunca.

Fonte: Rolling Stone

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